Cristo obedeceu até à morte e morte de cruz. Por isso Deus O exaltou e Lhe deu um nome que está acima de todos os nomes.
28 de março de 2010
Introdução28 de março de 2010
A liturgia deste Domingo de Ramos convida-nos a contemplar esse Deus que, por amor, desceu ao nosso encontro, partilhou a nossa humanidade, fez-Se servo dos homens, deixou-Se matar para que o egoísmo e o pecado fossem vencidos. A cruz (que a liturgia deste domingo coloca no horizonte próximo de Jesus) apresenta-nos a lição suprema, o último passo desse caminho de vida nova que, em Jesus, Deus nos propõe: a doação da vida por amor.
A primeira leitura apresenta-nos um profeta anônimo, chamado por Deus a testemunhar no meio das nações a Palavra da salvação. Apesar do sofrimento e da perseguição, o profeta confiou em Deus e concretizou, com teimosa fidelidade, os projetos de Deus. Os primeiros cristãos viram neste “servo” a figura de Jesus.
A segunda leitura apresenta-nos o exemplo de Cristo. Ele prescindiu do orgulho e da arrogância, para escolher a obediência ao Pai e o serviço aos homens, até ao dom da vida. É esse mesmo caminho de vida que a Palavra de Deus nos propõe.
O Evangelho convida-nos a contemplar a paixão e morte de Jesus: é o momento supremo de uma vida feita dom e serviço, a fim de libertar os homens de tudo aquilo que gera egoísmo e escravidão. Na cruz revela-se o amor de Deus, esse amor que não guarda nada para si, mas que se faz dom total.
Leituras Primeira Leitura - Leitura do Livro do Profeta Isaías (Is 50,4-7)
4 O Senhor Deus deu-me língua adestrada, para que eu saiba dizer palavras de conforto à pessoa abatida; ele me desperta cada manhã e me excita o ouvido, para prestar atenção como um discípulo.
5 O Senhor abriu-me os ouvidos; não lhe resisti nem voltei atrás.
6 Ofereci as costas para me baterem e as faces para me arrancarem a barba; não desviei o rosto de bofetões e cusparadas.
7 Mas o Senhor Deus é meu auxiliador, por isso não me deixei abater o ânimo, conservei o rosto impassível como pedra, porque sei que não sairei humilhado.
Palavra do Senhor.
Salmo Responsorial - Salmo 21
Meu Deus, meu Deus, por que me abandonastes?
Riem de mim todos aqueles que me vêem,
torcem os lábios e sacodem a cabeça:
“Ao Senhor se confiou, ele o liberte
e agora o salve, se é verdade que ele o ama!”
Meu Deus, meu Deus, por que me abandonastes?
Cães numerosos me rodeiam furiosos,
e por um bando de malvados fui cercado.
Transpassaram minhas mãos e os meus pés
e eu posso contar todos os meus ossos.
Meu Deus, meu Deus, por que me abandonastes?
Eles repartem entre si as minhas vestes
e sorteiam entre si a minha túnica.
Vós, porém, ó meu Senhor, não fiqueis longe,
ó minha força, vinde logo em meu socorro!
Meu Deus, meu Deus, por que me abandonastes?
Anunciarei o vosso nome a meus irmãos
e no meio da assembléia hei de louvar-vos!
Vós, que temeis ao Senhor Deus, dai-lhe louvores,
glorificai-o, descendentes de Jacó,
e respeitai-o, toda a raça de Israel!
Meu Deus, meu Deus, por que me abandonastes?
Segunda Leitura - Primeira Carta de São Paulo aos Filipenses (Fl 2,6-11)
6 Jesus Cristo, existindo em condição divina, não fez do ser igual a Deus uma usurpação, 7 mas ele esvaziou-se a si mesmo, assumindo a condição de escravo e tornando-se igual aos homens. Encontrado com aspecto humano, 8 humilhou-se a si mesmo, fazendo-se obediente até a morte, e morte de cruz. 9 Por isso, Deus o exaltou acima de tudo e lhe deu o Nome que está acima de todo nome.
10 Assim, ao nome de Jesus, todo joelho se dobre no céu, na terra e abaixo da terra, 11e toda língua proclame: “Jesus Cristo é o Senhor”, para a glória de Deus Pai.
Palavra do Senhor.
Proclamação do Evangelho de Jesus Cristo, segundo Lucas (Lc 23,1-49)
Naquele tempo, 1 toda a multidão se levantou e levou Jesus a Pilatos. 2 Começaram então a acusá-lo, dizendo:
Ass.: “Achamos este homem fazendo subversão entre o nosso povo, proibindo pagar impostos a César e afirmando ser ele mesmo Cristo, o Rei”.
L. 1: 3 Pilatos o interrogou:
L. 2: “Tu és o rei dos judeus?”
L. 1: Jesus respondeu, declarando:
Pres.: “Tu o dizes!”
L. 1: 4 Então Pilatos disse aos sumos sacerdotes e à multidão:
L. 2: “Não encontro neste homem nenhum crime”.
L. 1: 5 Eles, porém, insistiam:
Ass.: “Ele agita o povo, ensinando por toda a Judéia, desde a Galiléia, onde começou, até aqui”.
L. 1: 6 Quando ouviu isto, Pilatos perguntou:
L. 2: “Este homem é galileu?”
L. 1: 7 Ao saber que Jesus estava sob a autoridade de Herodes, Pilatos enviou-o a este, pois também Herodes estava em Jerusalém naqueles dias. 8 Herodes ficou muito contente ao ver Jesus, pois havia muito tempo desejava vê-lo. Já ouvira falar a seu respeito e esperava vê-lo fazer algum milagre. 9 Ele interrogou-o com muitas perguntas. Jesus, porém, nada lhe respondeu.
10 Os sumos sacerdotes e os mestres da Lei estavam presentes e o acusavam com insistência. 11 Herodes, com seus soldados, tratou Jesus com desprezo, zombou dele, vestiu-o com uma roupa vistosa e mandou-o de volta a Pilatos. 12 Naquele dia Herodes e Pilatos ficaram amigos um do outro, pois antes eram inimigos.
13 Então Pilatos convocou os sumos sacerdotes, os chefes e o povo, e lhes disse:
L. 2: 14 “Vós me trouxestes este homem como se fosse um agitador do povo. Pois bem! Já o interroguei diante de vós e não encontrei nele nenhum dos crimes de que o acusais; 15 nem Herodes, pois o mandou de volta para nós. Como podeis ver, ele nada fez para merecer a morte. 16 Portanto, vou castigá-lo e o soltarei”.
L. 1: 18Toda a multidão começou a gritar:
Ass.: “Fora com ele! Solta-nos Barrabás!”
L. 1: 19 Barrabás tinha sido preso por causa de uma revolta na cidade e por homicídio. 20 Pilatos falou outra vez à multidão, pois queria libertar Jesus. 21 Mas eles gritaram:
Ass.: “Crucifica-o! Crucifica-o!”
L. 1: 22 E Pilatos falou pela terceira vez:
L. 2: “Que mal fez este homem? Não encontrei nele nenhum crime que mereça a morte. Portanto, vou castigá-lo e o soltarei”.
L. 1: 23 Eles, porém, continuaram a gritar com toda a força, pedindo que fosse crucificado. E a gritaria deles aumentava sempre mais. 24 Então Pilatos decidiu que fosse feito o que eles pediam. 25 Soltou o homem que eles queriam — aquele que fora preso por revolta e homicídio — e entregou Jesus à vontade deles.
26 Enquanto levavam Jesus, pegaram um certo Simão, de Cirene, que voltava do campo, e impuseram-lhe a cruz para carregá-la atrás de Jesus. 27 Seguia-o uma grande multidão do povo e de mulheres que batiam no peito e choravam por ele. 28 Jesus, porém, voltou-se e disse:
Pres.: “Filhas de Jerusalém, não choreis por mim! Chorai por vós mesmas e por vossos filhos! 29 Porque dias virão em que se dirá: ‘Felizes as mulheres que nunca tiveram filhos, os ventres que nunca deram à luz e os seios que nunca amamentaram’. 30 Então começarão a pedir às montanhas: ‘Caí sobre nós! e às colinas: ‘Escondei-nos!’ 31 Porque, se fazem assim com a árvore verde, o que não farão com a árvore seca?”
L. 1: 32 Levavam também outros dois malfeitores para serem mortos junto com Jesus. 33 Quando chegaram ao lugar chamado “Calvário”, ali crucificaram Jesus e os malfeitores: um à sua direita e outro à sua esquerda. 34 Jesus dizia:
Pres.: “Pai, perdoa-lhes! Eles não sabem o que fazem!”
L. 1: Depois fizeram um sorteio, repartindo entre si as roupas de Jesus. 35 O povo permanecia lá, olhando. E até os chefes zombavam, dizendo:
Ass.: “A outros ele salvou. Salve-se a si mesmo, se, de fato, é o Cristo de Deus, o Escolhido!”
L. 1: 36 Os soldados também caçoavam dele; aproximavam-se, ofereciam-lhe vinagre, 37 e diziam:
Ass.: “Se és o rei dos judeus, salva-te a ti mesmo!”
L. 1: 38 Acima dele havia um letreiro: “Este é o Rei dos Judeus”. 39 Um dos malfeitores crucificados o insultava, dizendo:
L. 3: “Tu não és o Cristo? Salva-te a ti mesmo e a nós!”
L. 1: 40 Mas o outro o repreendeu, dizendo:
L. 4: “Nem sequer temes a Deus, tu que sofres a mesma condenação? 41 Para nós, é justo, porque estamos recebendo o que merecemos; mas ele não fez nada de mal”.
L. 1: 42 E acrescentou:
L. 4: “Jesus, lembra-te de mim, quando entrares no teu reinado”.
L. 1: 43 Jesus lhe respondeu:
Pres.: “Em verdade eu te digo: ainda hoje estarás comigo no Paraíso”.
L. 1: 44 Já era mais ou menos meio-dia e uma escuridão cobriu toda a terra até as três horas da tarde, 45 pois o sol parou de brilhar. A cortina do santuário rasgou-se pelo meio, 46 e Jesus deu um forte grito:
Pres.: “Pai, em tuas mãos entrego o meu espírito”.
L. 1: Dizendo isso, expirou.
(Aqui todos se ajoelham e faz-se uma pausa.)
L. 1: 47O oficial do exército romano viu o que acontecera e glorificou a Deus, dizendo:
L. 5: “De fato! Este homem era justo!”
L. 1: 48 E as multidões, que tinham acorrido para assistir, viram o que havia acontecido e voltaram para casa, batendo no peito. 49 Todos os conhecidos de Jesus, bem como as mulheres que o acompanhavam desde a Galiléia, ficaram a distância, olhando essas coisas.
Palavra da Salvação.
Comentário da condenação à salvação
Tão terrível a cena e o relato como o do domingo passado. Porém, com um final diferente. É como esses filmes nos quais o diretor roda dois finais e depois escolhe segundo o gosto do público. O relato da adúltera do domingo passado terminava em absolvição. O relato da paixão de Jesus termina em condenação. É um terrível paradoxo. O que perdoa, o que acolhe, o que salva, se vê castigado, excluído, condenado.
É como se toda sua pregação, tudo aquilo pelo qual entregou sua vida, a missão que tem dado consistência a sua trajetória vital, tivesse sido perfeitamente inútil. A graça e o perdão que presenteou não chegam a ele. Passou sua vida tentando salvar da morte os filhos e filhas de Deus, ao final não consegue se salvar a si mesmo das forças escuras da violência gratuita que percorrem o mundo. Sua morte é outra morte inútil das quais tratou de evitar com todas suas forças.
“Crucifica-o!”
Mas a vida segue. O povo pode ser terrivelmente cruel. Ao princípio, o tinham seguido multidões. O povo ia até ele apresentar suas dores, suas doenças. Agora são multidões os que se deixam levar pela violência e gritam em coro “crucifica-o!”. Nem sequer os seus seguem-lhe. Pedro nega que o conhecia, é o faz por três vezes. Na escuridão da noite a primeira regra é a de salvar a própria pele. Melhor que morra ele e que eu possa me salvar.
Sem dar-nos conta de que sua morte é a nossa. De que toda morte gratuita e violenta encurta nossa própria vida. Mas o povo, e até mesmos os discípulos, preferem olhar para outro lado, enquanto produzem-se os fatos. Ao final, um pouco de sentimento de culpabilidade por ter participado no linchamento daquele homem, por não ter feito nada para impedir, por não ter dado um passo à frente e dizer que... Já sabemos todos que o sentimento de culpabilidade com um pouco de tempo passa e, talvez, com um pouco de terapia e uns comprimidos se supere com relativa facilidade.
Pelo caminho temos esquecido essa preciosa cena da última Ceia de Jesus com seus discípulos. Jesus não era um ingênuo. Sabia o que ia passar. E, no momento de compartilhar o pão e o vinho na ceia, disse umas palavras que encheram de sentido tudo o que ia suceder. Não detiveram Jesus. Jesus entregou-se. É importante o matiz.
Comprometido até o final
Jesus foi a todo o momento o dono da situação. Sua morte não ia ser senão o último ato de uma forma de viver que tinha assumido livremente fazia muito tempo como conseqüência de sua experiência única de Deus. Ia confessar até o final que Deus é o das parábolas do Reino, o de sua aproximação com os marginalizados e pecadores, o de sua atenção extraordinária aos doentes, o que se preocupa com todos e com cada um.
E foi conseqüente até o final. Ainda que soubesse que ia ser duro. Isso é o que nos mostra a cena da oração no Horto. Não era agradável o que ia suceder. Mas Jesus ia ser fiel à sua missão. Sua confiança estava posta no Pai para além do imaginável, do previsível, do prudente.
Era muito realista. Na mesma cena da última Ceia já tinha visto o que davam de si seus discípulos. Após tanto tempo juntos, ainda seguiam pensando quem devia ser o primeiro entre eles. Não tinham entendido nada! Mas Jesus segue repetindo a mesma mensagem: vim para servir. Há que renunciar ao poder. O futuro, o Reino, está no serviço. E segue confiando neles. Para além do imaginável, do previsível, do prudente.
A história termina com a morte de Jesus. Não há resposta à sua confiança. Silêncio e escuridão. Abandonado pelos seus. Mas Jesus morreu confiando no Pai. E também na humanidade. Nos seus que o tinham deixado só. Nos soldados que debochavam dele. Nos judeus que o tinham condenado. Seguia confiando que o amor de Deus pode transformar os corações. Deter a sangria da violência e dar inicio a uma nova sociedade, a uma nova forma de viver, ao Reino de Deus. Essa confiança, essa entrega sem limites, esse amor até o final, essa é nossa salvação.
Fonte: www.coracaodemaria.org.br/90anos/interna.php?area=apalavra&cod_area=1&art_cod=1920